A ÁGORA BRASILEIRA: PURA XEPA DE FEIRA?
Por Maria do Espírito Santo Gontijo Canedo
Os sofistas que me desculpem, mas Sócrates é fundamental. Quem és tu, Coriolano? Até tu, Brutus? Os homens nem sempre são o que pode haver de melhor. Conhecer-se a si mesmo é bom; quase nunca muito bons são os espelhos públicos enferrujados que refletem a nossa imagem. Eu sou assim?! Se for, não quero ser mais... Dizer que roubar faz parte do jogo é transformar nosso ganancioso lado negro em norma... Mas como, se a norma veio justamente para conter esse lado? E não basta balançar a cabeça e dizer: Está tudo errado, tudo errado...
Antes estivéssemos discutindo a corrupção das formas de governo, teoria complexa, mas compreensível no campo da filosofia política. Não é isso que está em pauta. O que cabe pensar, em regime de urgência urgentíssima, é a inserção do pacto da corrupção, em vias de ser normatizado informalmente, numa certa ala carnavalesca (que se alastra) da política brasileira. Corromper para roubar virou uma espécie de princípio natural, lei fundante da administração da coisa pública, e o que é pior! A divulgação destes feitos invulgares pela mídia – embora extremamente necessária – corre o risco de banalizar os escândalos, de vulgarizar as ignomínias, uma vez que é típico da natureza humana a acomodação dos sustos e dos descalabros ao sentido, peso e valor, do corriqueiro. De certa maneira, tudo o que é muito comentado se torna monótono, vira rotina. Não se trata mais daquilo que cai no esquecimento, não é bem isto, antes fosse... Pior do que a queda no olvido é a lembrança indiferente de fatos chocantes. E não basta balançar a cabeça e dizer: Não tem mais jeito, não tem jeito...
Quase todos estão acordados, se calhar, para o caso canhestro do Calheiros. A coisa encalha, todo o mundo vaia, mais uma vaga que invade a praia e depois volta ao mar dissoluto, dissoluta em outras ondas do mesmo teor. O que era para ser chamado de fatal virou fenômeno natural e até mesmo os protestos fazem parte do pacote. E não basta balançar a cabeça e dizer: É um insulto, é um insulto à nossa inteligência...
Qual seria, então, a solução? Ora, se eu a tivesse pronta, sacada da cartola de um mágico hegeliano, eu a mostraria aqui e agora, em forma de coelho ideal, pombo metafísico, lenço teleológico ou moedas de ouro de tolo... Entre a corrupção e a ação para tolhê-la não há um biombo bambo e sim um muro da Jerusalém Celeste, de dificílimo acesso e ataque posto serem suas pedras sem peso compostas de letais gases etéreos. Combater moinhos de vento é o que há de mais difícil, já o sabemos desde o princípio do século XVII, mas talvez, mais do que nunca dantes, precisemos de Quixotes.
Um amigo me disse, dias atrás, que todo o mundo especula... Embora estivesse falando no contexto da economia, transladarei o conceito para o mundo da etimologia. A palavra especular vem do latim specularis e quer dizer pertencente ou relativo a espelho. Assim sendo, quando especulamos estamos, em última análise, nos reconhecendo ou buscando nos reconhecer por meio do espelho. Especular, dessa forma, é também, por analogia, o exercício/percurso do pensar.
Sócrates, o que nada sabia, se dizia um partejador das idéias dos seus discípulos, uma espécie de direcionador do processo do pensamento. Assim sendo, antes de partirmos em busca de mais uma solução mágica, antes de nos atolarmos na areia movediça do reclamar por reclamar, é preciso refletir sobre o que aí está, não como miragem e sim como clara evidência e realidade. Querendo ou não, o que vemos é a imagem num espelho – nem sempre claro – se não do que somos, mas do que nos tornamos como nação. Diante desta ineludível catástrofe, como agir? É o que mais nos cabe agora especular...
16.7.07
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